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O menino da ferrovia

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O ano era 1946. Em 13 de junho ele nasceu. Fazia quase 20 (vinte) anos que a ferrovia São Luís/Teresina tinha começado a funcionar plenamente, haja vista que a ponte metálica sobre o estreito dos mosquitos, que liga a Ilha de São Luís ao continente, somente fora inaugurada no ano de 1928.

 

Assim como acontecera próximo aos acampamentos destinados à sua construção, surgiu um pequeno povoado em terras do Município de Rosário (MA), já uma cidade próspera em função da produção, na região, de algodão e cana de açúcar que eram trazidos para São Luís a partir do seu porto. Chamou-se Carema, distante cerca de 70 Km da Capital Maranhense. Foi lá que ele nasceu.

Seus pais, José Bonifácio e Hormígida Cabral tiveram 8 (oito) filhos, sendo 4 (quatro) homens e 4 (mulheres). Ele era o caçula dos homens. Se naquela época já existissem os bebês da Johnson, ele certamente seria um deles. Era lindo, segundo dizem. Um belo bebê de olhos verdes.

O bebê cresceu cercado de muito amor e carinho. Sempre muito curioso, era a companhia constante do pai, homem de grande respeitabilidade na região. Acompanhava de perto as conversas da época e ali, vendo o vai e volta do trem de passageiros, crescia em si o desejo de viajar e aprender. Na estação de Carema, ao lado dos paneiros de farinha JM (foi a responsável pela fama além fronteiras da farinha de puba de mandioca ali produzida que genericamente passou a ser conhecida como farinha de Carema), vendia os deliciosos bolos que sua mãe fazia para engordar o orçamento familiar. Entre uma venda e outra alimentava seus sonhos de estudar.

E assim ocorreu. Logo seus pais visualizaram sua inclinação pelos livros e seguindo orientação da professora local, levaram seu menino para estudar em Rosário. Foi uma sábia escolha. Ali se destacou de tal forma que Rosário também ficou pequena para aquela criança que teimava em aprender. Mesmo sem grande capacidade financeira, foi possível mandar o jovem para estudar na capital. Ele não desapontou. Prestou seleção para o Colégio Liceu Maranhense e foi aprovado. Novo destaque. Ali também continuou a ser um brilhante aluno, sempre tirando notas altíssimas até completar o segundo grau. Já naquela época voltava os olhos para o passado e via que seu esforço estava sendo recompensado.

O menino da ferrovia partia agora para novo desafio. Estava decidido a prestar o vestibular para a Faculdade de Direito do Maranhão. Fez e foi aprovado em primeiro lugar. Completou o curso brilhantemente, tendo permanecido por mais de 30 (trinta) anos como uma das 10 (dez) maiores médias de notas da história do Curso de Direito. Colou grau em 1972. Durante todo o curso se mantinha na capital como datilógrafo da extinta SUDEMA (Superintendência de Desenvolvimento do Maranhão). Nessa época já havia sucumbido aos encantos de uma bela baixinha funcionária do Instituto Nacional de Previdência Social-INPS. Com D. Níusmar Pestana de Paula Barros constituiu família e quando se formou já haviam gerado dois filhos.

Era a época do regime militar. O menino da ferrovia era um jovem e brilhante advogado que récem saído da Faculdade passara a integrar o prestigiado escritório de advocacia do Dr. José Bento Neves que, posteriormente, viria a se tornar um grande Deputado Estadual do Maranhão. Tornou-se, em seguida, advogado do extinto Escritório Técnico de Administração Municipal-ETAM, ali permanecendo até 1979 quando foi convidado a integrar a equipe do récem eleito Governador do Estado do Maranhão João Castelo Ribeiro Gonçalves, como sub-chefe da Casa Civil, por indicação do seu antigo professor José Maria de Jesus e Silva, com quem trabalhara na elaboração do plano de Governo. Seu professor passaria em seguida a ser o Chefe da Casa Civil em substituição a José Burnett que se tornara Deputado Federal. José Maria deixaria o cargo para se tornar membro do Tribunal de Contas dos Municípios, abrindo espaço para que o jovem técnico se tornasse Chefe da Casa Civil aos 35 (trinta e cinco) anos. O menino venceu na vida.

No total ele foi 5 (cinco) vezes sub-chefe da Casa Civil nos Governos de João Castelo, Ivar Saldanha, Luis Rocha, Edison Lobão e no último Governo de Roseana Sarney; 2 (duas) vezes Chefe da Casa Civil, nos Governos de João Castelo e Luis Alves Coelho Rocha que o chamava carinhosamente de Moreno; Professor do Curso de Direito da Universidade Estadual do Maranhão; Consultor Jurídico da Federação das Indústrias do Maranhão-FIEMA; Advogado do Banco de Desenvolvimento do Estado do Maranhão-BDM e do Banco do Estado do Maranhão-BEM, onde foi Chefe de Gabinete da Presidência no Governo de Epitácio Cafeteira e Diretor Administrativo durante o Governo de João Alberto; Foi Presidente do Serviço de Imprensa e Obras Gráficas do Estado do Maranhão-SIOGE no Governo de Edison Lobão e hoje é Procurador do Estado do Maranhão aposentado, tendo sido aprovado em concurso público de provas e títulos em terceiro lugar.

Tal qual o General Romano, o menino da ferrovia veio, viu e venceu.

O menino que só queria estudar se tornou o jovem brilhante de ontem e este senhor de cabelos brancos de hoje (nem tantos cabelos brancos assim), na foto que ilustra este texto. Aos 71 (setenta e um) anos que completa hoje ele tem muito do que se orgulhar. Constituiu uma bela família juntamente com sua esposa e sempre companheira Níusmar. Tiveram três filhos que lhes renderam 9 netos, e estes até agora dois bisnetos e o terceiro não tarda a chegar.

Da ferrovia ficou a saudade que mata sempre que às sextas-feiras retorna para sua querida Carema e para sua Fazenda Recreio, aonde costuma reunir os amigos de infância e aqueles que conquistou ao longo da vida, além dos parentes com quem recorda os momentos felizes em que brincavam soltos sonhando com o futuro que estava por vir, no vai e volta do trem da estrada de ferro São Luís/Teresina.

O menino da ferrovia é meu pai tão amado, Antonio José Muniz, por quem nutro um invulgar orgulho.

Feliz aniversário meu pai.

 

 

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